Ações do Figma Despencam Apesar de Sólidos Resultados

As ações da Figma, empresa de software de design, sofreram uma queda acentuada de 14% nas negociações estendidas de quarta-feira, logo após a divulgação de seu primeiro relatório de resultados desde a abertura de capital (IPO) em julho. A reação do mercado surpreendeu, considerando que os números da empresa foram, em geral, positivos e superaram as expectativas.
A receita no segundo trimestre atingiu $249,6 milhões de dólares, um crescimento robusto de 41% em relação aos $177,2 milhões do mesmo período do ano anterior. Esse valor ficou ligeiramente acima da previsão de consenso de $248,8 milhões de dólares. A empresa registrou um lucro líquido de $846.000, revertendo uma perda significativa de $827,9 milhões registrada no segundo trimestre de 2024. O lucro operacional ajustado foi de $11,5 milhões de dólares.
Projeções Futuras e Estratégia de Crescimento
Olhando para o futuro, a Figma projetou uma receita entre $263 milhões e $265 milhões para o terceiro trimestre, o que representa um crescimento de aproximadamente 33%. Para o ano inteiro, a expectativa é de uma receita total superior a $1,02 bilhão, um aumento de cerca de 37% e acima do consenso do mercado.
Dylan Field, cofundador e CEO da Figma, explicou que parte do crescimento recente veio da monetização do Dev Mode, uma ferramenta que facilita a implementação de designs por desenvolvedores de software. No entanto, ele admitiu que esse impulso inicial pode moderar o ritmo de crescimento da receita no próximo trimestre. A taxa de retenção líquida de clientes, um indicador chave da expansão com clientes existentes, ficou em 129%, uma ligeira queda em relação aos 132% do primeiro trimestre.
A Grande Aposta em Inteligência Artificial
Apesar da volatilidade das ações, o CEO Dylan Field demonstrou confiança e uma visão de longo prazo, especialmente em relação à Inteligência Artificial. “Estamos apenas no começo do que espero ser uma longa relação juntos”, afirmou ele aos investidores. Field, que liderou a empresa durante a fracassada aquisição de $20 bilhões pela Adobe em 2023, não se deixa abalar por contratempos.
A empresa anunciou recentemente o Figma Make, que usa IA para criar designs de aplicativos e sites a partir de descrições do usuário, e o Figma Sites, que transforma esses designs em websites funcionais. A Figma também adquiriu a startup de gráficos vetoriais Modyfi e a de sistema de gerenciamento de conteúdo Payload. Field acredita que a IA não irá substituir os designers, mas sim ampliar o acesso à área, permitindo que mais pessoas criem. “Nossa filosofia é que, à medida que os modelos de IA melhoram, nós melhoramos”, disse ele. A empresa ainda não cobra integralmente por suas ferramentas de IA, mas já incorporou os custos em seu modelo financeiro e planeja oferecer a compra de “créditos de IA” adicionais no futuro.
A IA Remodelando Outras Indústrias
Enquanto a Figma navega sua estratégia de IA no mundo do design, outras startups estão usando a tecnologia para revolucionar setores tradicionais. É o caso da Eudia, uma startup de Palo Alto que se apresenta como o “primeiro escritório de advocacia nativo de IA”. Com um aporte de $100 milhões, seu objetivo é nada menos que acabar com o modelo de cobrança por hora, que, segundo o CEO Omar Haroun, saiu completamente do controle.
A empresa aproveitou uma legislação do Arizona, o único estado americano onde um escritório de advocacia não precisa ser propriedade de advogados, para criar seu modelo de negócios inovador. Gary Hood, conselheiro geral da Duracell (propriedade da Berkshire Hathaway), afirmou que o uso da Eudia para contratos e auditorias em processos de fusões e aquisições tem sido uma “escolha óbvia”. Ashish Agrawal, cofundador da Eudia, ressalta que a contribuição humana é essencial para que as ferramentas de IA funcionem corretamente, comparando a integração da IA à chegada de um novo funcionário que precisa ser incorporado “organicamente” à equipe.
O Espectro de um “Inverno da IA”
Apesar do otimismo e dos investimentos massivos que impulsionam empresas como Figma e Eudia, cresce no Vale do Silício a preocupação com um possível “inverno da IA”. O termo, que descreve períodos de desinteresse e corte de investimentos na área, já ocorreu diversas vezes nos últimos 70 anos. O temor atual é que a tecnologia não consiga corresponder às altíssimas expectativas e que o valor de mercado de muitas empresas relacionadas à IA esteja superinflado.
Existem paralelos históricos, como um relatório de 1966 que concluiu que a tradução por computador era mais cara, lenta e imprecisa que a humana, o que resultou em um corte drástico de financiamento para pesquisa. No entanto, há diferenças cruciais hoje. O boom atual é impulsionado principalmente por capital privado, não por financiamento governamental, e as ferramentas de IA já estão sendo amplamente implementadas em empresas e residências, não se limitando a experimentos de laboratório. A questão que permanece é se o ar frio que se sente no mercado é apenas uma brisa passageira ou o primeiro sinal de uma nova era glacial para a tecnologia.